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O SISTEMA SOLAR NUMA REPRESENTAÇÃO TEATRAL [1]

João Batista Garcia Canalle

Instituto de Física - UERJ

Resumo

Durante os cursos de aperfeiçoamento que ministrei, para professores de primeiro grau da Rede Pública do Município de São Paulo e do Núcleo Regional de Pato Branco, Sudoeste do Paraná, foram desenvolvidas as atividades abaixo descritas, que têm a finalidade de propor uma forma alternativa para ensinar os movimentos dos planetas, luas e cometas do sistema solar. Inicialmente é apresentado um modo “gráfico” de se visualizar as distâncias dos planetas ao Sol, fazendo-se uso de uma escala apropriada. Utilizando esta escala, pede-se ajuda aos alunos para desenharem círculos sobre uma quadra de esportes. Sobre estes círculos, que representam as órbitas dos planetas, os alunos caminham, correm, giram, etc., mostrando, assim, o sistema solar em movimento. O movimento dos satélites (luas) também é representado. Usando a mesma escala dos círculos, um barbante e duas pequenas estacas, mostramos como desenhar a elipse referente à órbita do cometa Halley. O seu movimento também é representado por um aluno que anda (e corre) sobre esta elipse. Esta ativa participação dos alunos na confecção dos círculos, elipse e movimentação como planetas, luas e cometas é que chamamos de representação teatral. O tema “Sistema Solar” geralmente é abordado na quinta ou sexta série do primeiro grau, depende da seqüência do currículo elaborado pelas Secretarias de Educação dos Estados. Nos cursos de formação de professores de primeiro grau é ensinado pelos professores de Física. Nestas atividades o professor tem a oportunidade de fazer o aluno participar ativamente de sua aula, tornando-a prática e, como verão, também divertida. Além de astronomia, os alunos também estarão trabalhando, praticamente, com a geometria, ao traçarem no chão, círculos e elipses. Os professores que exercitam o salutar hábito de questionar seus alunos antes de explicar, descobrirão alunos com “explicações intuitivas” das mais absurdas; algumas citarei no texto. Professores de pré-escola que tiveram contato com estas atividades disseram que elas são parcialmente aplicáveis também na pré-escola!

Introdução

            Quando os livros abordam o tema “Sistema Solar”, geralmente trazem uma figura esquemática do mesmo. Esta figura, normalmente é constituída pelo Sol e planetas, sendo que não estão em escala os diâmetros do Sol e dos planetas e nem tão pouco as distâncias dos planetas ao Sol e não há nenhuma referência nos textos para esse fato. Apesar de não estarem em escalas, os planetas maiores são representados por círculos grandes e os planetas menores por círculos pequenos, mas tão fora de escala que a Terra parece ser a metade de Júpiter e este, 3 ou 4 vezes menor que o Sol. Um procedimento experimental para resolver este problema será apresentado num outro artigo. Outro problema dos livros didáticos é sobre as distâncias dos planetas ao Sol. Estas figuras nunca obedecem a uma escala para as distâncias. A figura passa a noção errada de que os planetas estão eqüidistantes uns dos outros. Quando o livro tenta ser mais claro ele coloca uma tabela com as distâncias ao Sol. São números enormes, sendo que ninguém consegue imaginar tais distâncias, e eles não conseguem dar nenhuma noção, aproximada que seja, da distribuição dos planetas ao redor do Sol. É objetivo deste trabalho oferecer uma solução simples para este problema.

            Outro problema que está implícito nestas figuras esquemáticas do sistema solar é que elas costumam representar os planetas enfileirados, um ao lado do outro. Além da figura não dar nenhuma idéia dos movimentos dos planetas, ela permite que as pessoas pensem que os planetas giram ao redor do Sol desta forma, ou seja, um ao lado do outro, sempre em fila. Este autor já teve a oportunidade de encontrar professores que acreditavam nisso e explicaram que pensavam assim, porque viram a figura nos livros.

            Damos, a seguir, uma sugestão de como resolver estes problemas, com a participação dos alunos, numa forma “teatral”.

As distâncias dos planetas ao Sol

            Para darmos uma idéia correta das distâncias médias dos planetas ao Sol, sugerimos que sejam reduzidas as distâncias médias, dos planetas ao Sol, através de uma escala(1) . Por exemplo, se adotamos a escala de 10 milhões de quilômetros para cada 1 cm de papel, teremos Mercúrio a 5,8 cm do Sol, pois sua distância média ao Sol é de 58 milhões de quilômetros; Vênus estaria a 10,8 cm do Sol, pois sua distância média é de 108 milhões de quilômetros, e assim para os demais planetas.

            Desenvolvemos esta atividade com os alunos da seguinte maneira: providenciamos tiras de papel, com largura de, aproximadamente, 7 cm e comprimento de 6m. Desenhamos uma bolinha (com 1 ou 2 mm de diâmetro) numa das extremidades da tira para representar o Sol, a partir dessa bolinha desenhamos outra a 5,8 cm para representar Mercúrio, Vênus estaria a 10,8 cm do Sol, a Terra fica a 15,0 cm do Sol, Marte fica a 22,8 cm, Júpiter a 77,8 cm, Saturno a 143,0 cm, Urano a 287,0 cm, Netuno a 450,0 cm e, finalmente, Plutão a 590,0 cm do Sol (todas as distâncias são em relação ao Sol (primeira bolinha)). Colocamos o nome do Sol e de cada planeta sobre cada bolinha. Esticamos a tira e teremos uma visão exata da distribuição das distâncias médias dos planetas ao Sol. Numa escala ainda menor, mostramos na Fig. 4 um pedaço da tira.

Fig. 4 - As letras sobre os pontos (planetas) representam M(Mercúrio), V(Vênus), T(Terra), M(Marte), J(Júpiter), etc.

            Esta é uma atividade que o aluno pode fazer em casa ou em sala aula e, é claro, a tira fica com ele, para que possa mostrá-la aos familiares e amigos.

            Só mesmo fazendo a tira toda para percebermos como os planetas mais distantes estão incrivelmente mais distantes do Sol, do que os planetas Mercúrio, Vênus, Terra e Marte.

O movimento dos planetas ao redor do Sol

            Para mostrar que os planetas giram ao redor do Sol (todos no mesmo sentido) fazemos o seguinte: sobre a tira de papel do item anterior, colocamos um barbante esticado, e sobre o Sol e cada planeta damos um nó. Enrolamos o barbante num cabo de vassoura (de aproximadamente 10 cm de comprimento) para não embaralhar o barbante. Em seguida vamos a uma quadra de esportes e no centro dela seguramos fixo o nó que representa o Sol, mantendo esticado o barbante e segurando um giz no nó que representa Mercúrio, traçamos um círculo sobre a quadra. Repetimos este procedimento traçando um circulo para cada planeta.

            Traçados os 9 círculos no piso da quadra, colocamos um aluno, representando o Sol, sobre o centro dos círculos (onde está o Sol). Colocamos outro aluno para andar sobre o círculo de Marte, outro sobre o círculo de Júpiter, outro para andar sobre o círculo de Saturno e idem para Urano, Netuno e Plutão. Sobre os círculos de Mercúrio, Vênus e Terra, não é possível colocar ninguém, pois eles estão próximos demais do aluno que representa o Sol. Feito este posicionamento inicial, sugiro, abaixo, uma série de procedimentos para ilustrar o movimento dos planetas, seus satélites e cometas.

            1º - Explicar que a velocidade dos planetas diminui com a distância dele ao Sol; assim sendo, o aluno que representar Marte deve correr sobre a órbita (círculo) de Marte, aquele que representar o movimento de Júpiter deverá correr mais devagar, quem representar Saturno apenas andará, e assim sucessivamente, tal que o aluno-Plutão caminhará pé-ante-pé.

            2º - Explicar que o tempo gasto pelo planeta, (aluno) para dar uma volta ao redor do Sol é chamado de período de translação e representa a duração do ano do planeta. A Terra gasta 365,25 dias para fazer este movimento. Os planetas mais próximos do Sol gastam menos tempo que a Terra e aqueles que estão mais distantes gastam mais tempo que a Terra. Pode-se observar do movimento dos alunos, que aqueles que estão mais próximos do Sol, gastam muito menos tempo para dar uma volta ao redor do Sol do que aqueles que estão mais distantes.

            3º - Coloque os alunos a se moverem, representando o sistema solar, e dê as explicações 1 e 2 acima. Depois de algumas voltas dos alunos, pare-os e explique que, além dos planetas girarem ao redor do Sol, eles giram ao redor de si mesmos, vamos pedir, então, para que os alunos-planetas também façam isso, ou seja, caminhar sobre os círculos enquanto giram sobre si mesmos. Para que possam combinar os dois movimentos é preciso que transladem mais devagar, para se evitar quedas.

            4º - Explicar, também, que o tempo gasto pelo planeta para girar sobre ele mesmo é chamado de período de rotação. A Terra executa esse movimento em 24 horas (aproximadamente). É esse movimento que dá origem ao dia e à noite. Na translação todos planetas giram no mesmo sentido, horário, digamos, mas na rotação 8 planetas giram sobre si no mesmo sentido, horário, por exemplo, sendo que Vênus gira no sentido contrário. Também é preciso lembrar que o eixo de rotação dos planetas não é perpendicular ao plano de sua órbita, ao contrário do que vemos na quadra, onde o eixo de rotação dos alunos-planetas é perpendicular ao plano da quadra.

            5º - Explicar o dia e a noite da seguinte maneira: supondo que a cabeça dos alunos que estão orbitando (circulando) o Sol, seja a Terra, quando o aluno está de frente para o Sol é dia no seu rosto e noite na sua nuca, e quando ele está de costas para o Sol é dia na sua nuca e noite no seu rosto, pois ele não está vendo o Sol.

            6º - Além desses movimentos (translação e rotação) os planetas executam outros movimentos, mas que não são factíveis de serem representados com o corpo humano.

            7º - Também é preciso chamar a atenção para o fato de que o plano das órbitas dos planetas não são coincidentes, como ocorre na quadra, mas que na verdade, estão ligeiramente inclinados uns em relação aos outros.

            8º - Falta ainda esclarecer que as órbitas dos planetas não são exatamente círculos, como desenhados no chão, na verdade são órbitas ligeiramente achatadas, que chamamos de elipses e serão estudadas mais adiante.

O movimento das luas ao redor dos planetas

            Depois dos movimentos de translação e rotação dos alunos-planetas e da explicações acima, podemos incluir as luas (satélites naturais) nos movimentos do sistema solar. Com exceção de Mercúrio e Vênus, todos os demais planetas possuem luas que giram ao redor deles. Vejamos como representar o movimento das luas ao redor dos planetas.

            9º - Inicialmente vamos ilustrar o movimento da Lua ao redor da Terra. Vamos fazer um aluno representar a Terra, e como a órbita (círculo) da Terra está muito próxima ao pé de aluno que está representado o Sol, vamos usar o círculo que representa a órbita de Urano. Os demais planetas (alunos) não participam desta atividade, apenas observam. Enquanto o aluno-Terra gira sobre si e ao redor do Sol (muito lentamente), outro aluno, que representa a Lua, deve girar ao redor da Terra, mas sempre olhando para a Terra, pois a Lua sempre mostra a mesma face para a Terra. O aluno-Terra não fica olhando para a “Lua”. Já encontrei pessoas que acreditavam que o ocidente via uma face da Lua e que o oriente via só a outra face da Lua. Outras pessoas não imaginam que a Lua gira sobre si mesma. Esta atividade ajuda a esclarecer tais dúvidas.

            10º - Marte tem duas luas, chamadas Fobos e Deimos. Vamos representá-las de modo análogo ao que fizemos para o sistema Terra-Lua. Substitui-se os alunos Terra e Lua, por outro que será Marte e outros dois que representarão as luas Fobos e Deimos. Marte gira ao redor do Sol e sobre si mesmo, enquanto que suas luas giram ao seu redor. Também é preciso usar o círculo que representa a órbita de Urano, pelo motivo exposto no item 9. Ainda não é sabido se as luas dos demais planetas apresentam sempre a mesma face para eles, como faz a lua da Terra.

            11º - O mesmo procedimento fazemos para Júpiter e suas luas. Como este é o maior dos planetas, usamos sempre o maior dos alunos para representá-lo. Como ele tem 16 luas, também devemos usar o círculo que representa a órbita de Urano, pelo motivo explicado no item 9.

            12º - Analogamente se faz para Saturno e suas 17 luas. Como Saturno tem anéis, pedimos ao aluno que representa Saturno para girar com os braços abertos para representar os anéis. Também pode-se usar um bambolê.

            13º - Analogamente para Urano e suas 15 luas.

            14º - Idem para Netuno e suas 8 luas.

            15º - Idem para Plutão com sua única lua.

O movimento dos cometas ao redor do Sol

            Mas, além do Sol, planetas e luas, o sistema solar também tem os cometas. Vejamos como podemos representá-los na quadra. Vamos usar, como exemplo, o cometa Halley. Este cometa é periódico e tem órbita bastante excêntrica, isto é, sua órbita é uma elipse bastante achatada.

            16º - Para desenhar a órbita do Halley na mesma escala usada para os planetas, corta-se um barbante com 10,4 m de comprimento e dá-se um nó a 5,1 m de uma das pontas. Veja esquema na Fig. 2.

 

Fig. 5 - Esquema da posição do nó sobre o barbante usado para a construção da elipse do cometa Halley.

            A seguir amarra-se as pontas. Pressiona-se, então verticalmente, a tampa de uma caneta (ou de um pedaço de cabo de vassoura) contra o centro dos círculos (Sol) e de outra a 5,1 m do Sol (a distância entre os 2 nós do bastante). Coloca-se o barbante ao redor dessas tampas de canetas, estica-se o barbante e risca-se o chão com um giz, conforme ilustra a Fig. 6. A posição onde estão as canetas chamamos de focos da elipse e o Sol está num desses focos, como diz a 1ª lei de Kepler.

Fig. 6 - Esquema do procedimento usado para desenhar a elipse

            17º - Para representarmos, esquematicamente, a cauda do cometa riscamos o chão, conforme ilustra a Fig. 7. Observe que a cauda é sempre radial ao Sol.

Fig. 7 - Esquema da cauda do cometa

            18º - Para representarmos o movimento do cometa pede-se para um aluno representar o Sol (que fica no centro dos círculos, girando lentamente sobre si mesmo) e outro representar o cometa. O aluno-cometa deve andar lentamente quando está longe do Sol, aumentar gradativamente sua velocidade enquanto se aproxima do Sol, correr quando passa próximo do Sol e diminuir gradativamente sua velocidade enquanto se afasta do Sol, pois é assim que faz o cometa. A movimentação do aluno-cometa deve ocorrer sobre a elipse desenhada no item 17º.

            19º - Para finalizar, coloca-se todos os alunos-planetas, o aluno-Sol e o aluno-cometa para se moverem simultaneamente ao redor do Sol. Mas como o Sol não é uma estrela fixa, faça o aluno-Sol caminhar em direção a um dos cantos da quadra, carregando consigo todo o sistema solar.

Conclusão

            Com as atividades acima descritas, o professor melhor ilustra sua explicação sobre o movimento dos planetas, luas e cometas ao redor do Sol. O aluno, por outro lado, tende a entender melhor estas explicações, pois além de estar ouvindo e vendo, ele está participando delas.

Referências

(1)   Laboratório Básico Polivalente de Ciências - para 1º grau, FUNBEC, p. 157-163, 2ª      edição, 1986.



[1] Caderno Catarinense de Ensino de Física, v. 11, n o 1, p. 27 - 32, 1994

Sobe